Nos últimos tempos defendemos interesses de clientes que viram seus créditos ameaçados pelo plano de recuperação judicial de empresas, que buscava suprimir garantias de terceiros. Ou seja, mesmo havendo garantia real ou fidejussória esta poderia ser suprimida pelo plano de recuperação judicial da devedora.
O plano de recuperação tem a natureza jurídica de novação das dívidas. A novação, em regra, exclui as garantias originárias prestadas pelo devedor, mas não atinge garantias prestadas por terceiros.
No entanto, empresas passaram a prever em seus planos de recuperação a extensão da novação às garantias prestadas por terceiros. Basta que a maioria dos credores vote a favor da cláusula supressiva, que as garantias reais ou fidejussórias podem ser eliminadas.
Ao ser confrontado sobre a burla, o Superior Tribunal de Justiça, em contradição com a Súmula 581 do próprio Tribunal, entendeu pela legalidade da cláusula, em julgado no REsp 1.700.487:
“Uma vez aprovado o presente plano, ocorrerá a supressão de todas as garantias fidejussórias e reais existentes atualmente em nome dos credores a fim de que possa a recuperanda se reestruturar e exercer suas atividades com o nome limpo, tanto da sociedade quanto de seus sócios, tendo em vista a novação pela aprovação do plano”
O credor que não concordasse com a supressão da garantia, por ser minoria em sua classe, deveria então sujeitar-se ao plano aprovado, ficando à mercê da efetividade do plano por parte da recuperanda. Sua diligência em buscar a garantia antes de fazer o negócio e sua contrariedade ao plano seriam simplesmente ignorados.
Para minorar o dano da equivocada interpretação do STJ no recurso acima, e tranquilizar os credores e sistema de garantias, recentemente foi revista a posição no REsp 1.794.209 (o acórdão ainda não foi publicado). O recurso teve relatoria do Min. Villas Boas Cueva e foi julgado na Segunda Seção, devendo ser respeitado pelas instâncias inferiores face ao efeito vertical do precedente.
A Segunda Seção do STJ prossegue na possibilidade de supressão de garantia, mas a anuência do credor deve ser expressa, ou seja, não tendo o credor expressamente aprovado a supressão, esta não o atingirá, mantendo incólume sua garantia. Por anuência expressa considera-se a aceitação sem ressalvas, não bastando a abstenção ou ausência.
Assim, havendo cliente em situação econômica grave, que venha a abrir uma recuperação judicial, deve o credor ficar atento às cláusulas do plano de recuperação para que não seja surpreendido com a supressão de sua garantia e outras possibilidades que venham a surgir. Para tanto, o acompanhamento por um advogado, desde o início do processo, certamente ajudará para a efetiva satisfação do crédito.
Douglas Teles Pimel – OAB/RS 114.691