É preciso que os riscos e as normas de funcionamento da rede sejam alocados nas cláusulas do contrato de forma a servir de bússola para as Partes, não só nos momentos de conflito, mas na sua rotina diária, que seja, verdadeiramente, uma ferramenta de gestão dos negócios empresariais e de criação de valor.
Juliano Nicola Sangalli
Sócio de Gravina Advogados
Professor do Núcleo de Direito, Economia e Negócios do CEU-IICS
Um dos maiores desafios de um Fabricante ou Distribuidor na colocação de seus produtos ou serviços é encontrar o parceiro comercial.
Na seleção do novo lojista é esperada a verificação de requisitos objetivos: (i) regularidade empresarial: inscrições, registros, licenças, alvarás e autorizações necessárias ao funcionamento da sua atividade; (ii) perfil financeiro: patrimônio líquido da empresa e seus sócios, histórico de cumprimento de obrigações para com fornecedores e credores e (iii) garantias: capacidade de suportar decisões financeiras em relação à sua atividade.
No início do relacionamento comercial as partes tendem a facilitar a troca de produtos, informações e serviços, mas este comportamento pode mudar[2].
Isto porque a cada um dos atores não é dado prever o futuro e as situações possíveis, porque não possuem “modelos mentais matemáticos perfeitos[3]”.
Além desta limitação racional, há o risco da seleção adversa do participante do canal de distribuição. Surge quando as partes não compartilham informações relevantes antes de ter iniciado o relacionamento, o que pode conduzi-los a decisões equivocadas que não tomariam se recebessem o conhecimento prévio e adequado antes da contratação[4].
Independentemente destas circunstâncias e da vontade das Partes, de forma simplificadora pode-se classificar a composição do canal de distribuição em dois grandes segmentos: o dos playersbons e cooperativos; e o dos ruins e oportunistas[5].
A situação ótima seria todo o canal de distribuição composto por entes cooperativos, envolvidos em construir e manter uma imagem saudável do produto ou serviço que representam no mercado.
Uma forma possível de mitigar os riscos desta seleção adversa é a «Teoria da Sinalização», de Eric Posner, uma vez que uma das partes pode fornecer à outra, desde antes de iniciar o relacionamento, sinais de integridade, comprometimento, seriedade que podem conduzir mais facilmente aos níveis de cooperação necessários para o fortalecimento da relação comercial.
Integrar uma rede significa aceitar as normas que fazem parte daquele canal de distribuição. Segundo a «Teoria da Estima» de Richard MacAdams[6], há um sentimento de participação do indivíduo em relação ao grupo e uma busca social por padrões aceitos de comportamento. Agir fora destes padrões pode conduzir a sanções sociais e jurídicas.
A institucionalização[7]de um modelo de conduta facilita a aceitação por parte de todos, de modo que o próprio canal de distribuição define o que é justo e equilibrado, por meio de contratos, secundados pela legislação específica.
As normas sociais tendem a influenciar o comportamento das partes durante o relacionamento comercial. A motivação para o cumprimento destas regras de conduta, segundo Posner, é explicada pela dicotomia entre os bons, os cooperativos e os ruins, os oportunistas. Através dos sinais – daí o termo teoria da sinalização – as pessoas emitem informações sobre o grupo em que estão inseridos.
Lamentavelmente, o que se tem visto no dia-a-dia dos negócios empresariais é que, apenas no final do relacionamento descobre-se os oportunistas e essa revelação pode vir acompanhada de passivos relevantes.
É nestas horas que se retira o contrato da gaveta e muitas vezes as cláusulas são insuficientes para viabilizar a recuperação deste prejuízo.
Um contrato é muito mais do que um instrumento que serve para criar, modificar e extinguir direitos, deve, antes de tudo, ser um indutor de comportamento.
É preciso que os riscos e as normas de funcionamento da rede sejam alocados nas cláusulas do contrato de forma a servir de bússola para as Partes, não só nos momentos de conflito, mas na sua rotina diária, que seja, verdadeiramente, uma ferramenta de gestão dos negócios empresariais e de criação de valor.
É recomendável um olhar multidisciplinar para a construção desta espécie de contrato, que vá além da visão meramente legalista, para provê-lo de cláusulas que minimizem os custos de transação, para que o contrato seja um eficiente mecanismo de coordenação dos negócios.
[1]Texto baseado no artigo do mesmo autor: “Aspectos econômicos e estruturais dos contratos atípicos de distribuição: uma abordagem sob a ótica do Law and Economics” publicado no livro Ensaios de Direito Empresarial e Econômico, Juruá, 2010.
[2]FRAZIER, Gary L. On the Measurement of Interfirm Power in Channels of Distribution. Journal of Marketing Research. v. 200, n. 2, New York, 1983.
[3]SIMON, Herbert A. Models of bounded rationality. Cambridge: MIT Press Classic, 1984.
[4]MACHO-STADLER e PÉREZ-CASTRILLO. An introduction to the Economics of Information – Incentives and contracts. Oxford University Press Inc. New York, 2001.
[5]POSNER, E. A. Law and Social Norms. Cambridge, MA: Harvard University Press. 2000.
[6]MCADAMS, R. H. The origin, development and regulation of norms. Michigan Law Review. Volume 96, n. 2, Michigan, 1997, pp. 338-433.
[7]NORTH, Douglas. C. Institutions, Institutional change and economic performance. Cambridge. Cambridge University Press, 1990.