Saúde, Economia e Distanciamento Social Participativo

Normas de afastamento social causam severos danos pessoais e econômicos. São atos de “imperium” de entes estatais, nem sempre coerentes com a realidade local. Isto é ainda mais grave se a reincidência de casos se projeta no tempo.

Recente texto no The New Yorker conta que Shakespeare, durante toda sua vida (52 anos), conviveu com a peste negra, com picos em 1582, 1592-93, 1603-04, 1606, e 1608-09. A praga levou amigos, parentes e três irmãs. Fecharam-se teatros, festas, menos igrejas, onde não se supunha contagiar. Testaram várias medidas: luvas, queima de calçados velhos, cheiravam laranja e matavam cães e gatos em meio ao pavor e promiscuidade. Hard times! Dizem que as pessoas já não se conheciam no distanciamento social.

Hoje a ciência e a comunicação permitem novos convívios. Mas não afastam o vírus. E são previsíveis novas ondas, experimentos da ciência e protocolos sanitários, sendo construtiva a ideia do “distanciamento controlado participativo” anunciado pelo Governo do Estado.

No Brasil as questões de saúde competem à União, Estados e Municípios (CF art. 23, II e art. 24, XII), de forma cumulativa ou concorrente. E o artigo 198, I da Constituição define um sistema único “descentralizado”. O municipalismo teve sua marca, inclusive no licenciamento da atividade econômica e, nessa tensão entre princípios relacionados à saúde e à ordem econômica, ambos merecem interpretação garantística.

O papel da União e do Estado são incontornáveis, mas devem evitar conflitos federativos com os Municípios. De igual sorte o Ministério Público. Não há crime da autoridade que atua no cumprimento de suas funções, nem do particular coerente com as leis locais enquanto não dirimido eventual conflito de competência, que segundo o STF merecem ser analisados individualmente (ADPF 672-DF).

São questões de saúde e economia que podem se estender largamente no tempo e merecem atenção de toda sociedade, com flexibilização e especial respeito às escolhas locais e suas políticas de conveniência e oportunidade.

Maurício Salomoni Gravina

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