Reconstruir a República

É preciso restabelecer a confiança na República, perdida pelo mau uso de cargos, instituições e recursos, sentimento estampado em cada brasileiro.

É preciso restabelecer a confiança na República, perdida pelo mau uso de cargos, instituições e recursos, sentimento estampado em cada brasileiro.
As falhas do sistema organizativo do Estado e seus freios e contrapesos expuseram um modelo pouco eficiente e muito suscetível à corrupção.
Autoridades, empresários fora-da-lei (das leis do mercado e da cidadania) e partidos políticos roubaram o sonho da democracia e do livre mercado.
Foram à prisão dirigentes partidários, parlamentares, agentes públicos e executivos. Viu-se modernos acordos de cooperação com a Justiça e leniência para empresas e stakeholders, mas pouco se sabe dos partidos políticos e do processo eleitoral.
Além de indicarem candidatos à Presidência, Congresso, Assembleias e Governos dos Estados, quase dois bilhões de reais foram destinados ao fundo eleitoral, oriundo de recursos públicos, geridos por dirigentes partidários.
Há um hiato muito grande entre a Justiça civil, criminal e eleitoral neste País. Isso merece informação adequada. Partidos políticos têm relevante função nos sistemas democráticos e nas constituições, mas não estão acima da ordem jurídica.

O cidadão, obrigado a votar, tem o direito de não concordar com um processo eleitoral que nasce em dívida com a sociedade, por um histórico de imoralidades suspensas por privilégios, inclusive de foro, que não se estendem ao cidadão.
Não se esperara desobediência civil ou intervenção, a antítese do Estado de Direito. Assim como a abstenção de voto, viciada de permissividade ou ausência de opções políticas. O fato é que o critério objetivo de legitimidade não dispensa o da moralidade.
O cidadão merece informação adequada e não um pacto de entrega a um processo contagiado por práticas inaceitáveis na vida pública e privada. Eleição não é ficção.
Umberto Eco ilustrou o “acordo ficcional” como uma atitude pela qual o leitor suspende temporariamente a descrença e se deixa conduzir pela narrativa, para ver onde lhe conduz a obra literária, por mais fantástica que seja. Na ficção, todavia, a entrega acompanha a promessa de, ao final, encontrar-se a riqueza do contexto literário.
Eleições nem sempre trazem um prêmio ao final. Também levam a marca da incógnita assim como a ficção, mas não permite fechar os olhos irrefletidamente.
Processo eleitoral não é cumprir agenda. Nem há como suspender a descrença. Tem de ser legítimo. E a democracia é o ideal motivador, uma espécie de farol a indicar caminhos de trafego e colisão.
Será preciso modernizar a República para reconstruir a legitimidade das instituições públicas, com informação e novas políticas de Direito constitucional, especialmente de organização do Estado e relações com o cidadão.
Eficiência, reequilíbrio de Poderes, informação e controles, especialmente de gastos, podem retomar o sentido da República. Não para desprezar as conquistas. Mas para maximizar instrumentos de transparência, controles, sinalização e confiança social.

Maurício Salomoni Gravina

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