Realismo Jurídico e o Novo Processo

Modernas teorias do direito, sobretudo a italiana, representada pela escola Genovesa de Giovanni Tarello, adotam uma interpretação cética do direito. Tem por premissas o realismo jurídico, ou seja, o direito como ele é na vida cotidiana, sem idealizações.

Sua postura ajuda a entender os atuais sistemas jurídicos, inclusive o brasileiro, em que o sentimento de insegurança jurídica predomina, sobretudo por afastar a interpretação crua e textual de um dispositivo normativo. Aquilo que se interpreta prima facie¸ não será necessariamente norma jurídica.

Normas, nos ensinamentos de Riccardo Guastini, não se interpretam. Antes, são produtos da interpretação das fontes do direito. Interpretar não é apenas esclarecer, mas antes atribuir significado. Para estas correntes modernas, deve ser superada a ideia positivista de que um texto possui um significado intrínseco que deve ser descoberto por meio da interpretação correta para se chegar ao real significado da norma.

Daí que o Legislativo passa a ser criador de textos que darão as linhas gerais do direito, mas quem efetivamente fará deles a norma é o Judiciário, por meio da interpretação. Passa a fazer sentido quando o Min. Luiz Fux, à semelhança da Corte dos Estados Unidos, declara que “a Constituição é aquilo que o Supremo diz que ela é”, porque na prática é isso o que ocorre.

Sendo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça intérpretes últimos da Constituição e da Lei Federal, respectivamente, de suas decisões extrai-se a norma jurídica. Negar vigência ou contrariar precedentes destas Cortes significa, em última instância, ignorar o Estado Democrático de Direito, por ir de encontro às suas normas.

A necessidade de interpretação decorre da chamada “dupla indeterminação do direito”: os textos são equívocos e as normas são vagas. A equivocidade textual compreende a ambiguidade da língua em que escrito o texto (p. ex. o conceito de “casa” no art. 5º, XI, CF), complexidade, implicação, defectibilidade e o famoso taxativo/exemplificativo (p. ex. cabimento de agravo na forma do art. 1.015, CPC).

A citada equivocidade tem suas razões para além da má técnica legislativa de redação. Decorre dos interesses conflitantes dos intérpretes, diferentes visões de justiça, métodos interpretativos e construções dogmáticas, como visões políticas.

A vagueza normativa é fruto da indeterminação de quais casos será aplicada a norma. Para exemplificar, os critérios de analogia como extensão da norma e da dissociação como restrição da norma são critérios de dubiedade quanto a aplicação da norma.

O Código de Processo Civil de 2015 foi fortemente influenciado por esta visão realista e doutrinadores estão reformulando a própria função dos tribunais superiores e tribunais de justiça frente a esta filosofia. Para conseguir jogar o jogo do processo será preciso desapegar das visões tradicionais e aceitar o novo, o sistema como é, apesar das críticas que aparecem.

Douglas Teles Pimel – OAB/RS 114.691

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